Doce Veneno: A Mulher da Taça de Absinto

 


Chuva, Jazz e Olhos que Matam

Ele a conheceu numa terça-feira, sob uma chuva fina que transformava a cidade em um reflexo turvo de luzes e sombras. O som distante dos carros misturava-se ao jazz que escapava pelas frestas das janelas do último andar de um prédio antigo.

O bar era um relicário de outros tempos. Paredes revestidas de veludo verde, luz amarelada filtrada por abajures com franjas, garçons de coletes e gravatas que pareciam saídos de um filme noir. E, no centro de tudo, como se fosse a única cor viva em um quadro antigo, estava ela.

Sentada sozinha, pernas cruzadas, vestido preto com uma fenda que sugeria mais do que mostrava. Os cabelos negros caíam sobre um ombro, e os olhos — profundos, letais — pareciam avaliá-lo antes mesmo que ele se aproximasse.

Na mão, uma taça de absinto. Um detalhe estranho. Quase ninguém pedia aquilo. A bebida esverdeada, o aroma de ervas, a ritualística preparação… tudo nela parecia fora de lugar e, ao mesmo tempo, exatamente onde deveria estar.

Ele, advogado racional e cético, não acreditava em destino. Mas, naquela noite, acreditou em impulso.

— Posso pagar a próxima? — perguntou, a voz mais baixa do que pretendia.

Ela ergueu os olhos, como se já soubesse que ele faria aquilo. Um meio sorriso.

— Pode. Mas saiba que tudo o que ofereço tem um preço.

O nome dela era Mirena. E ele não tinha a menor ideia do quanto aquela noite mudaria tudo.


O Veneno que Cresce em Silêncio

Nos dias seguintes, Mirena tornou-se um pensamento obsessivo. Havia algo no modo como ela falava, na cadência lenta das palavras, na maneira como seus dedos contornavam a borda da taça antes de beber.

Encontros casuais começaram a se repetir. Um olhar num café. Um toque breve no braço ao se despedirem. O perfume dela — mistura de jasmim e algo metálico, quase ferroso — ficava impregnado na pele dele.

Sonhava com ela. Sonhos úmidos e inquietantes. Via-a lambendo o canto da taça, sentindo o sabor da bebida e, de alguma forma, do próprio desejo dele. Imaginava sua boca descendo por sua garganta, sentindo o calor subir, um arrepio na espinha que o deixava acordado até tarde.

Mesmo nos dias em que não a via, percebia sinais dela. Uma sombra na esquina. Um bilhete com uma frase ambígua. Um gole de absinto servido sem que ele tivesse pedido.

Mirena não se entregava fácil. Era como uma dança. Primeiro um passo, depois um recuo. Deixava-o faminto por mais, mas sempre em pequenas doses — até que ele estivesse pronto para se render por completo.


A Noite da Cobertura

Certa noite, o convite veio por mensagem curta:
“Hoje, meia-noite. Quero que venha.”

O endereço levava a um prédio alto no centro. A porta do apartamento se abriu sozinha, como se ela soubesse exatamente o momento em que ele chegaria.

Lá dentro, velas acesas espalhavam sombras pelas paredes. Um vinil antigo tocava uma melodia melancólica. O ar estava carregado com o cheiro doce de jasmim misturado a algo mais espesso, quase intoxicante.

Mirena estava descalça, com um vestido de seda que deixava o contorno dos seios visível sob a luz. Na mão, novamente, uma taça dourada.

— Hoje você vai provar o que ninguém sobreviveu para contar — disse, entregando-lhe a bebida. — Está disposto?

Ele não respondeu. Apenas bebeu.

O sabor era amargo e doce ao mesmo tempo. Uma mistura que queimava e acariciava. Sentiu o corpo aquecer, o sangue pulsar mais rápido.


O Primeiro Toque

Ela o empurrou contra a parede, os lábios colando nos dele com uma fome contida. A língua explorava devagar, como quem saboreia um doce raro. Suas mãos deslizaram pelo peito dele, afrouxando a gravata, desfazendo os botões.

Ele gemeu baixo quando sentiu os dedos dela acariciarem seu abdômen, descendo, provocando, mas sem tocar onde ele mais queria.

Mirena sorria como se controlasse cada batida do coração dele. E talvez controlasse mesmo.

O vestido caiu de seus ombros, revelando pele quente e suave. Ele a segurou pela cintura, puxando-a para si, sentindo o calor de seu corpo e o perfume inebriante.


A Entrega

A cama foi o primeiro palco. Os beijos se tornaram mais urgentes, as mãos mais ousadas. Ele chupou os seios dela devagar, saboreando cada gemido. Sentiu o bico endurecer entre os lábios, a respiração dela acelerar.

— Mais… — ela sussurrou, segurando sua cabeça contra o peito.

As mãos dele deslizaram por suas coxas, separando-as. O calor entre as pernas dela era como fogo. Quando ele a tocou, ouviu um suspiro profundo, quase um aviso.

Mirena o guiou para baixo, e ele obedeceu. A língua explorou cada dobra, cada ponto sensível, até ela tremer e gemer alto, os dedos afundando em seu cabelo. O gosto dela era intenso, levemente adocicado, como o absinto que havia bebido.


O Clímax Mortal

Quando ele entrou nela, foi como mergulhar num abismo quente e irresistível. Os corpos se chocavam, as unhas dela deixavam marcas em suas costas. A cada estocada, Mirena o puxava mais fundo, como se quisesse fundir seus corpos em um só.

Ela montou sobre ele, o quadril se movendo com precisão cruel, levando-o ao limite. O prazer crescia até se tornar quase dor. Ele gozou com força, sentindo como se algo mais fosse arrancado junto com o orgasmo — uma parte de si que nunca mais voltaria.

O mundo ficou turvo. Sua visão, desfocada. A última coisa que viu antes de apagar foi Mirena lambendo o canto da taça, olhando-o com um sorriso satisfeito.


O Aviso no Espelho

Acordou sozinho, o corpo dolorido e coberto de pequenos cortes. No banheiro, o espelho estava embaçado, mas sobre ele havia uma frase escrita com batom vermelho:

“O primeiro gole é doce. O segundo, mortal.”

Ele tocou o próprio pescoço. Sentiu uma pontada. E percebeu, com um arrepio, que não se lembrava exatamente de quanto tempo havia passado.


Romance fantasmagórico na Itália

Por Clara Noir para o blog Noites Proibidas.
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